Quem se
interessa por transar com um robô masculino?
Os novos humanóides sexuais mantêm as limitações e
os clichês da indústria dominada por homens héteros.
Por Samantha ColeTraduzido
porAmanda Guizzo Zampieri
Jan 15
2018, 12:05pm
“Nate”,
um dos RealDolls que servirá como base para os robôs da Realbotix. Crédito:
RealDoll.
Há poucas evidências de que os
robôs de sexo sejam o “sonho molhado” na distopia que as manchetes pintam por
aí.
Ainda assim, eles continuam
avançando. Quando saíram as primeiras notícias de que robôs de sexo masculino
(robôs são objetos e não têm gênero, contudo, estamos nos referindo à forma
como são rotulados pela Realbotix) podem aparecer ainda este ano, as lojas
on-line começaram a espumar de raiva com a
ideia de um robô robô empunhando um pênis. Porém, com todas as inovações na tecnologia e no sexo, eu
me pergunto: a quem ele se destina?
Num sábado recente, Matt
McMullen, CEO da Realbotix, contou ao DailyStar Online que
a empresa planeja lançar uma versão “masculina” de seus robôs de sexo este ano.
Atualmente, a empresa só anuncia robôs de sexo femininos, chamados de
“Harmony”, e que, também, estão para ser lançados. A Realbotix é propriedade da
Abyss Creation, e sua empresa-irmã é a RealDoll. A Realbotix me contou que
robôs novos serão parecidos com a linha atual de RealDolls masculinos.
“Nick”,
um dos RealDolls masculinos que servirá como base para robôs da Realbotix. Ele
é um leitor. Crédito: RealDoll.
A maioria dos robôs de sexo que
vimos até agora é protótipo com corpos de mulheres, aparentemente projetados
para homens heterossexuais (um “bordel de robôs de sexo”,
em Barcelona, chamou a atenção do mundo durante alguns dias no ano passado).
Um robô humanoide completo, capaz
de proporcionar prazer a uma pessoa seria incrível, e está muito além do
cronograma se a previsão for lançá-lo este ano. Então, antes de me embrenhar em
uma jornada no universo do robô, perguntei à Realbotix para confirmar se a
versão masculina era verdade e se o lançamento ocorreria ainda este ano.
“Sim, posso confirmar que a
Realbotix já está trabalhando na versão masculina dos robôs que estão para ser
lançados”, me contou Guile Lindroth, um porta-voz da empresa, por e-mail.
Embora a empresa não tenha confirmado um cronograma específico, ele afirmou que
os robôs masculinos também poderão ser controlados por aplicativos de IA, com
conteúdo adaptado para se assemelharem aos de um homem. Assim como a Harmony, esses
robôs novos terão sensores de calor e de toque.
“Isso presume que a única coisa
que representa um sexo espetacular para as mulheres é bater estaca o máximo que
você puder.”
Contudo, os críticos afirmam que
a Realbotix é um embuste. “Trata-se de um robô criado por Matt McMullen através
de lentes masculinas”, me contou Cindy Gallop, fundadora do MakeLoveNotPorn,
por telefone. Ela leu para mim as frases de McMullen em um dos artigos sensacionalistas:
os robôs poderiam ser ligados e “ir até onde você quiser”.
“‘Até onde você quiser’ não é uma
definição feminina de um sexo fantástico”, ela disse. “Isso presume que a única
coisa que representa um sexo espetacular para as mulheres é bater estaca o
máximo que você puder. Foda-se essa merda.”
Um toy redondo no formato das
partes da mulher é o suficiente para indivíduos portadores de pintos: escolha
um orifício e divirta-se. Para as mulheres, isso não funciona. “Nesse mundo
maravilhoso da igualdade entre robôs, eu adoraria saber como é que esse robô
vai me fazer ter um orgasmo arrasador usando a boca, a língua e os lábios”,
Gallop disse. “Eu quero muito ver como seria uma abordagem feita e produzida
por mulheres dos robôs masculinos.”
Trata-se de algo que Kate Devlin, cientista da
computação e autora do livro Turned On: Science of the Sex Robot, sem
edição em português, passa a maior parte de seu tempo estudando. “Os robôs de
sexo e os sex toys são dois caminhos divergentes, o robô de sexo em sua forma
atual está emergindo do mercado de robôs de sexo”, ela me contou por e-mail.
“Seria muito mais interessante e
muito menos controverso se esses caminhos pudessem convergir, com tecnologia de
sexo interativo incorporada em formas não humanas abstratas.”
Em um nível muito básico, uma
maior representação de mais tipos de preferências sexuais e corpos além da forma
feminina hiperssexualizada é uma coisa boa, afirma a autora do blog Girl
on the Net (que trabalha sob pseudônimo por questões de privacidade)
me contou por e-mail. Um robô de sexo masculino seria uma dádiva para homens
gays em busca de um companheiro humanoide, por exemplo. Mas ainda assim, seria
uma definição socialmente determinada de algo “sexy”.
“Um dos maiores problemas com que
ainda nos deparamos no universo sexual é o fato de que há muito tempo o ‘sexo’
foi definido como ‘aquilo que os caras heterossexuais achavam sexy’, e existe
um universo enorme de desejos sexuais mundo afora que não está refletido no
pornô culturalmente dominante e nos robôs de sexo”, ela afirmou.
O que pode ser percebido pela
frase “ir até onde você quiser”.
Os robôs masculinos deram um
passo na direção de uma representação mais diversificada na tecnologia sexual,
mas não necessariamente um passo adiante. Uma versão padrão com abdômen
de tanquinho, braços tonificados e um olhar estranhamente enfadonho: mesmo que
eles aleguem extrapolar os limites da robossexualidade, a Realbotix se prende
na ideia antiquada do que os homens heterossexuais acham que as mulheres
querem. E quando as mulheres assistem ao pornô hetero, os caras são mais softboy. E
ainda temos que escolher entre um robô feminina e um masculino com padrões de
atratividade nada realistas – essas coisas não abalam as normas de gênero nem
exploram novos territórios para as preferências sexuais a serem pesquisadas.
As personalidades de inteligência
artificial dos robôs de sexo também são tipicamente programadas como chatbots
heteronormativos e reforçadores de estereótipos. Devlin me contou que prefere
ver a robótica voltada para o sexo com formatos abstratos e não humanos, mas
que proporcionam prazer.
“Tem muita tecnologia que ainda
nem existe e que será necessária para chegar nas formas como as pessoas
imaginam.”
Mas no fim do dia, toda essa
conversa sobre foder com robôs masculinizados é muita especulação. Como Kyle Machius, desenvolvedor
de teledildônicos me contou por mensagens do Twitter, praticamente todas as
histórias que vemos nas manchetes que vemos sobre eles envolvem empresas que
ainda estão, no melhor dos casos, em fase de pesquisa e desenvolvimento, e “se
baseando completamente no que há de pior”.
Um robô animatrônico que responde
ao toque, se comunica por meio de inteligência artificial e não mata você no
meio de uma trepada ou arranca seu pau fora ainda
está no futuro. Os robôs atuais mal conseguem caminhar,
quem dirá fazer um bom sexo.
“Não estamos nem perto em termos
de fidelidade com os sex toys ou mesmo em qualquer setor do mercado que envolva
robôs”, me contou Machius. “Tem muita tecnologia que ainda nem existe e que
será necessária para chegar nas formas como as pessoas imaginam quando pensam
em robôs ‘de sexo’.”
Por enquanto, o “robô de sexo
masculino” continua um manequim com uma cinta peniana.
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